13 de agosto de 2010

O varal


Olha através do vidro e lá fora chove. Observa o movimento das gotas que caem e que molham as plantas, que abaixam a poeira e que molham suas roupas no varal, sem preocupação. Continua refletindo sobre a paisagem e mal se dá conta que gotas também escorrem de seus olhos. Antes de tocar seu rosto lavado pelas lágrimas, se compara com o varal, que está carregado de roupas molhadas e pesadas assim como seu coração que está flutuando em um grande ar de melancolia e ressentimento. Sai da janela e anda rumo a sala. Busca entre as múltlipas revistas um pequeno caderno de capa vermelha.Acha. Abre e lê as primeiras setenças. Lembra de cada momento que a levou a escrever e sabe que tudo aquilo era uma grande ilusão, mas que algum dia poderia render um bom livro. As poesias, as provas de amor e de afeto estão perdidas nas folhas de um livro, quase amarelas. Às vezes o causador de seus versos reaparece e lhe vem pertubar seus sonhos. Aparece e lhe toca o rosto, olha em seus olhos e estes lhe fazem juras de amor eterno. Seu sorriso toca-lhe a alma e faz brotar em seus lábios um desejo incontrolável de tocar os dele e assim responde a provocação do oponente. O momento torna-se sublime, mas os sonhos acabam e este some como as luzes da cidade no meio de uma fina e intensa neblina.
Volta a olhar o pequeno caderno, o barulho da chuva e do relógio fazem a melodia do momento. Indaga-se dos motivos de pensar naquela distante inspiração. Por que me provocas? Se sabes que sou presa fácil para suas armadilhas, por que olhas para mim com tais olhos de ternura, se sabes que me perco num perigoso labirinto e tú não vens me salvar? Conte-me, eu preciso saber!
Fecha o caderno.Não quer as respostas.
Tenta esquecer aquele caderno há tempos,mas ele não segue as recomendações de sua confidente, pois insiste em ficar ali entre as revistas, para lembrá-la semanalmente de seus versos, pois uma poeta jamais pode se esquecer de seus versos, por mais que estes lhe tragam tristesa.
A chuva cai lá fora. Ela anda rumo a janela, abre-a. Pega o caderno e o coloca em posição de arremesso, mas algo parace que segura sua mão, como uma mãe que fala a seu filho: -Não faça isso meu filho, você irá se machucar. Porém algo desconhecido move suas mãos e o caderno alça voo para fora da janela. A chuva molha cada página, verso a verso. As palavras escritas ali escorrem pela água, e dentro da sala todos os sentimentos escorrem em lágrimas.
Pouco a pouco as gotas cessaram. E brotara no céu os primeiros raios de sol. Iluminavam desde o quarto até a pequena estatueta que ficava sobre um pequeno criado-mudo. Os raios de sol não iluminavam apenas o ambiente, iluminavam o olhos dela. As luzes da esperança já iluminavam seus caminhos, no vidro via-se um esboço de um arco-íris, este com cores leves, suaves. O vento soprava fresco e preguiçoso,as roupas do varal já esboçavam vontade de ficarem secas.
As roupas eram como ela, estavam lá sozinhas, penduradas, pesadas, levando consigo a vontade de encontrar sua verdadeira identidade. Seu sorriso, suas vontades, seus sonhos estavam pendurados como no varal, porém pendurados em um pequeno caderno de capa vermelha. O vento sopra e ajuda amenizar o efeito da água, para ela o vento serve de combustível, pois a leva para buscar suas roupas ,antes que outro vendaval as leve para outros varais, e as prenda em outro quintal triste.
As roupas secam, suas esperanças enchem-se de força . Agora ela constroi um novo varal, agora só com roupas secas, que esperam alguém, que as olhem, que as julguem e que venha recolhe-las para sempre.

Mari Pereira

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